Introdução: A briga pela sucessão
apostólica é bastante antiga. Ainda hoje, após 2000 anos de cristianismo, alguns grupos
teimam em reivindicar tal sucessão de forma ininterrupta. Ou seja, alegam ter
preservado fielmente o ensino de Cristo e dos apóstolos e tê-los repassado de
forma original e intacta a cada geração de fiéis. Dentre estes grupos, a briga
torna-se bastante acirrada entre católicos ortodoxos e católicos romanos. No
mundo ocidental, o catolicismo romano reivindica ser a única tradição cristã
válida. Já, no oriente, a igreja ortodoxa é quem o diz. Afinal de contas, quem
possui a verdadeira tradição apostólica? E as igrejas reformadas (protestantes)
onde ficam no meio de toda esta disputa? Este artigo visa explorar um pouco
mais o assunto (inesgotável, diga-se de passagem) do ponto de vista da Igreja
Ortodoxa. Vejamos:
1. Qual o significado de
Ortodoxia? E de Igreja Ortodoxa?
Chamamos Ortodoxia à verdadeira
doutrina - neste caso, a verdadeira doutrina de Cristo. Ortodoxia é uma palavra
grega que significa, à letra, glória (doxa) reta, direita, justa, verdadeira
(orto). Assim, chama-se Ortodoxia à Igreja que se manteve fiel à Verdade,
transmitida pela Tradição, desde os Apóstolos até nossos dias. Igreja Ortodoxa
é, portanto, a Igreja de Cristo, a que permaneceu sempre una e indivisa, fiel à
verdade da doutrina Cristã. No entanto, é verdade que na Idade Média se
verificou a separação entre Ocidente e Oriente, resultante da Própria divisão
do Império Romano entre Império do Ocidente e Império do Oriente, tendo como
centro Bizâncio (Constantinopla). E também é verdade que pouco a pouco se criou
uma distinção nítida entre "catolicismo romano", tipicamente
ocidental, e um Cristianismo "oriental", ortodoxo.
2. Quais foram as causas que
levaram à separação da Igreja Romana e da Igreja Ortodoxa?
Porque é que se verificou o cisma
da Igreja Romana? Porque é que Roma se separou do tronco comum e fecundo da
árvore da Tradição, criando um Cristianismo "Romano" a que deu o nome
contraditório de "Catolicismo"? O seu cisma não pode ser identificado
com nenhum acontecimento particular da História, nem se lhe pode atribuir uma
data precisa. Para essa separação progressiva terão contribuído diversos
fatores, entre os quais a oposição política entre Constantinopla e o
"império" de Carlos Magno, o afastamento da Tradição por desvios
sucessivos do pensamento e da prática da Igreja Romana, divergências no campo
teológico e no da Vida da Igreja. No entanto, talvez tenha sido este último
aspecto - o de Roma criar um conceito diferente do que é a vida e a missão da
Igreja - que acabou por ser o fator determinante ou, pelo menos, a gota de água
que fez transbordar o vaso cheio de erros e falhas. De fato, a Igreja de Roma,
graças a fatores essencialmente políticos, de ambição do poder temporal,
desenvolveu a partir da Idade Média, a doutrina da primazia do Papa (título,
aliás, dado aos Patriarcas de Roma e de Alexandria) como último e, depois, como
único recurso em matéria de Fé. Ora, isto era, é e será, completamente estranho
à Tradição da Igreja dos Apóstolos, dos Mártires, dos Santos e dos Sete
Concílios Ecumênicos. Para Esta, a autoridade em questões de Fé repousa nos
Concílios - no acordo entre todos os Bispos, sucessores dos Apóstolos - e no
Povo Real, Hierarquia e fiéis. Havendo, portanto, divergências entre Oriente e
Ocidente acerca da noção de autoridade na Igreja, não podia existir acordo
quanto à maneira de resolver os problemas entretanto surgidos no seio da Igreja
una: a questão do "Filioque", a diferença dos ritos, a existência de
presbíteros casados, a utilização do latim ou das línguas indígenas, o uso da
barba ou da cara rapada entre clero etc. Para a Igreja de Roma, o seu Bispo é o
"chefe da Igreja universal" porque se considera o sucessor de São
Pedro. E interpreta como fundação da Igreja e proclamação dessa chefia
universal a célebre passagem do Evangelho de Mateus: "Tu és Pedro e sobre
esta pedra edificarei a Minha Igreja, e as portas do Inferno não prevalecerão
contra Ela"(16,18). Para a Igreja una e indivisa a interpretação desta
passagem do Evangelho é toda outra. Como disse Orígenes (fonte comum da
Tradição patrística da exegese), Jesus responde com estas palavras à confissão
de Pedro: este torna-se a pedra sobre a qual será fundada a Igreja porque
exprimiu a Fé verdadeira na divindade de Cristo. E Orígenes comenta: "Se
nós dissermos também: 'Tu és o Cristo, Filho de Deus Vivo', então tornamo-nos
também Pedro (...) porque quem quer que seja que se una a Cristo torna-se
pedra. Cristo daria as chaves do Reino apenas a Pedro, enquanto as outras pessoas
abençoadas não as poderiam receber?". Pedro é, então, o primeiro
"crente" e se os outros o quiserem seguir podem "imitar"
Pedro e receber também as mesmas chaves. Jesus, com as Suas palavras relatadas
no Evangelho, sublinha o sentido da Fé como fundamento da Igreja, mais do que
funda a Igreja sobre Pedro, como a Igreja Romana pretende. Tudo se resume,
portanto, em saber se a Fé depende de Pedro, ou se Pedro depende da Fé...Por
isso mesmo, São Cipriano de Cartago pôde afirmar que a Sé de Pedro pertence ao
Bispo de cada Igreja Local, enquanto São Gregório de Nissa escrevia que Jesus
"deu aos Bispos, através de Pedro, as chaves das honras do Céu". A
sucessão de Pedro existe onde a Fé justa (ortodoxa) é preservada e não pode,
então, ser localizada geograficamente, nem monopolizada por uma só Igreja nem
por um só indivíduo. Levando a teoria da primazia de Roma às últimas
conseqüências, seríamos obrigados a concluir que somente Roma possui essa Fé de
Pedro - e, nesse caso, teríamos o fim da Igreja una, santa, católica e
apostólica que proclamamos no Credo: atributos dados por Deus a todas as
comunidades sacramentais centradas sobre a Eucaristia, possuindo um verdadeiro
Episcopado, uma verdadeira Eucaristia e, portanto, uma presença autêntica de
Cristo. Afirma, depois, a Igreja de Roma que é ela a Igreja fundada por Pedro e
que essa fundação apostólica especial lhe dá direito a um lugar soberano sobre
todo o universo. Ora a verdade é que, para além do fato de não sabermos
realmente se São Pedro foi o fundador dessa Igreja Local e o seu primeiro Papa
(aliás, terão os Apóstolos sido Bispos de qualquer Igreja Local...?), temos
conhecimento que outras cidades ou outras localidades mais pequenas podiam,
igualmente, atribuir a si mesmas essa distinção, por terem sido fundadas por
Pedro, Paulo, João, André ou outros Apóstolos. Assim, o Cânone do 6º Concílio
de Nicéia reconhece um prestígio excepcional às Igrejas de Alexandria,
Antioquia e Roma, não pelo fato de terem sido fundadas por Apóstolos, mas
porque eram na altura as cidades mais importantes do Império Romano e, sendo
assim, deram origem a importantes Igrejas Locais...Toda esta divergência de
pontos de vista entre Roma, considerando-se única detentora da verdade e da
autoridade, e as restantes Igrejas Irmãs, que desejavam manter-se fiéis ao
espírito da Tradição herdada dos Apóstolos, acabou por resultar nos trágicos
acontecimentos de 1054 e 1204 - no dia 16 de julho de 1054, os legados do Papa
de Roma entraram na Catedral de Santa (em Constantinopla, capital do Império),
um pouco antes de começar a Sagrada Liturgia, e depositaram em cima do altar
uma bula que excomungava o Patriarca de Constantinopla e todos os seus fiéis.
Esta separação oficial, decidida pela Igreja Romana, teria sua confirmação em
1204, quando os cruzados, que se intitulavam cristãos, assaltaram
Constantinopla, saquearam e pilharam, fizeram entrar as prostitutas que traziam
consigo para dentro do santuário de Santa , sentaram uma delas no trono do
Patriarca, destruíram a iconostase e o altar, que eram de prata. E o mesmo
aconteceu em todas as igrejas de Constantinopla.
3. Quais são as diferenças
existentes entre a Igreja Romana e a Igreja Ortodoxa?
Eis a pergunta clássica, a que
nos é feita obrigatoriamente... A primeira vista, para quem está de fora, dir-se-ia
que entre a Igreja de Roma e as Igrejas Ortodoxas existem apenas diferenças de
"pormenor". Na prática, as diferenças são profundas e assinalaram
destinos bem separados desde, pelo menos, o século 11. Tentando resumir essas
diferenças, poderíamos dizer que são duas maneiras distintas de estar no Mundo.
E, de fato, só vivendo cada uma dessas espiritualidades se pode reconhecer como
são diferentes entre si...Mas vejamos mais em detalhe quais são essas
divergências que opõem a Igreja Romana à Tradição. A espiritualidade
ocidental-romana tende a colocar o indivíduo acima da comunidade, enquanto a
espiritualidade ortodoxa age, instintivamente, de maneira oposta, sabendo que
"ninguém se salva sozinho". O Ocidente encara a matéria e o espírito
como irremediavelmente separados e opostos entre si, enquanto o Oriente
desconhece essa falsa oposição, trazendo a matéria aos mais sagrados atos de
comunhão com Deus. Essas duas diferentes visões do mundo, do homem, da Igreja e
até de Deus refletem-se, por exemplo, na arquitetura dos templos: enquanto no
Ocidente, a partir de uma certa época (final da Idade Média) se começou a
cultivar um estilo exuberante e pesado, profundamente "terrestre" (na
nossa época, esse peso das coisas deste mundo atingiu talvez o seu auge, com a
construção de templos em cimento armado iguais a qualquer edificação profana -
um banco ou cinema...), no Oriente, ontem como hoje, a arquitetura cristã é
muito mais "leve", tendendo para o alto e obedecendo a um simbolismo
imensamente rico. Por exemplo, as cúpulas em forma de chama que vemos nas
igrejas russas, com as suas cores brilhantes, em que predomina o dourado,
proclamam o poder regenerador da Criação que foi dado à Igreja de Cristo. Ou
seja: a própria arquitetura cristã ortodoxa anuncia a futura transfiguração do
Universo e afirma que mesmo agora a Terra se transforma em Paraíso, sempre que
a Liturgia se celebra e a Graça divina desce sobre a comunidade cristã
celebrante. A decoração interior dos templos é também eloqüente em relação a
essas vivências diferentes da mesma mensagem do Cristianismo: os templos
ortodoxos representam a união gloriosa do Céu e da Terra, embora a santidade e
o mistério persistam representados pela Iconostase que separa o Santuário do
resto do templo; por seu turno, os templos da Igreja Romana, pela sua própria
mistura de estilos e arquitetura, refletem a constante necessidade de mudança
de quem perdeu o sentido da Tradição e da eternidade. Também são significativas
as diferenças verificadas nas Liturgias - a Igreja Ortodoxa celebra normalmente
uma Liturgia com mais de 1500 anos de existência; a Igreja Romana celebra
cerimônias sucessivamente sujeitas a alterações, quer no texto, quer na forma. Outra
das diferenças reside na importância desmedida que a Igreja Romana dá as
funções e à figura do Papa de Roma, considerando-o "chefe universal"
da Igreja. É uma visão centralizadora da Igreja, completamente estranha à
Tradição cristã, que resultou em parte das circunstâncias históricas e
políticas vividas no Ocidente. Efetivamente, no Ocidente, o Bispo de Roma atua
como senhor todo poderoso de uma Igreja que não lhe pertence e as suas ordens,
em princípio, são rigorosamente executadas como se se tratasse das decisões de
um chefe temporal. Do ponto de vista da Igreja Romana, o centro do mundo está
de fato em Roma e o Papa é o seu líder supremo. Para a Igreja Ortodoxa, que
procura cumprir escrupulosamente a Tradição, Roma até ao séc. XI era apenas o
primeiro dos Patriarcados tradicionais e o seu Bispo era o Patriarca do
Ocidente, "primeiro entre os seus iguais" - o que não lhe dava o
direito a qualquer função de "chefia" da "Igreja Universal"
(outra idéia estanha à Tradição): o único chefe de Igreja é Cristo, e não o
Papa de Roma ou o Patriarca de Constantinopla...Outras diferenças consistem na
questão do casamento dos Presbíteros e Diáconos, na maneira como os cristãos
são ensinados a benzer-se ou a rezar, ou na administração dos próprios
Sacramentos - por exemplo, o Batismo romano é feito por aspersão da água,
enquanto o Batismo ortodoxo é feito por tripla imersão completa do corpo na
água; a Eucaristia na Igreja Ortodoxa é ministrada, desde sempre, segundo as
duas espécies, pão e vinho, etc. Também os textos das orações diferem no
Ocidente e no Oriente - isso acontece, por exemplo, com o Pai Nosso, a Ave
Maria e, principalmente, com o Credo de Niceia-Constantinopla. Aliás, no caso
do Credo, a Igreja Romana introduziu no texto original um elemento, o
"Filioqüe", que deu origem ao seu próprio cisma - ao contrário do que
alguns historiadores afirmam, o cisma é realmente "do Ocidente",
visto que foi a Igreja Romana quem se separou da comunhão de Fé das Igrejas
Irmãs. Até mesmo em relação à música sacra diferem as duas espiritualidades:
enquanto na Igreja Ortodoxa continua a ser utilizada apenas a voz humana no
louvor a Deus (tal como manda a Tradição), na Igreja Romana, depois de se ter
abandonado o canto gregoriano, foi adotada toda a espécie de instrumentos
musicais, cedendo às modas de cada época. Além do Credo, outras diferenças
dogmáticas existem que separam a Igreja Romana da grande fonte da Tradição - é
o caso, por exemplo, da "Imaculada Conceição" de Maria, ou do
"Purgatório", ambos conceitos e dogmas estranhos à Tradição da
Igreja, inventados pura e simplesmente pelos teólogos de Roma; ou da falsa
oposição entre graça e liberdade; ou a própria concepção do pecado original -
Roma acredita e ensina que o pecado de Adão e Eva é "hereditário", é um
pecado de "natureza", enquanto para a Igreja una o pecado é sempre um
ato pessoal, de pessoa livre e responsável: nós não herdamos
"naturalmente" o pecado dos nossos primeiros pais; seremos culpados
como eles se pecarmos como eles pecaram. A Tradição patrística define a herança
da Queda como a da mortalidade e não a do pecado (por isso também o sentido do
Batismo dos recém nascidos não é o da remissão dos pecados, que não existem
ainda, mas o de lhes dar uma vida nova e imortal que os seus pais, mortais, não
lhes puderam transmitir).
4. Uma das questões dogmáticas
que separam a Igreja Romana da Igreja Ortodoxa é a questão do «Filioqüe». Qual
o seu significado?
A palavra "Filioqüe"
significa "e do Filho" e representa uma afirmação teológica
introduzida abusivamente pelo Ocidente no texto original do Credo de
Niceia-Constantinopla. Essa interpretação abusiva começou por ser feita em
Espanha, nos Concílios de Toledo dos séculos 6 e 7 e , mais tarde,
generalizou-se a todo o Ocidente. Vejamos o que diz o texto original do Credo:
"Creio no Espírito Santo (...) que procede do Pai, e com o Pai e o Filho
recebe a mesma adoração e a mesma glória". Portanto,temos uma afirmação
muito clara de que: «O Pai, criador de todas as coisas, gerou o Filho e espirou
o Espírito Santo; Tanto o Pai, como o Filho, como o Espírito Santo, são
adorados e glorificados do mesmo modo; isto é, nós, cristãos, adoramos e
glorificamos uma Trindade perfeita, três Pessoas num só Deus.» Ao alterar esse
texto, aprovado por todos os Padres conciliares e inspirados pelo Espírito
Santo, a Igreja Romana impôs aos seus fiéis a seguinte modificação: «Creio no
Espírito Santo (...) que procede do Pai e do Filho ('Filioqüe')" Isto
significa que o Espírito Santo é visto como uma terceira Pessoa "diminuída"
em relação ao Pai e ao Filho. Como se o Espírito Santo já não devesse ser
adorado e glorificado do mesmo modo e com a mesma fé com que o são o Pai e o
Filho...» Para quem está fora e não vive intensamente a presença ativa da
Santíssima Trindade em todos os atos da vida cristã, pode parecer que esta
questão do "Filioqüe" é um simples jogo de palavras. Pensar assim é
cair num erro grave: o de acreditar que em matéria tão fundamental como a
Teologia há questões de "pormenor" que os teólogos se entretêm a discutir...Mas
pior do que isso é ignorar que os Concílios Ecumênicos proibiram formalmente
que fossem introduzidas quaisquer modificações no Credo, precisamente porque o
Credo é patrimônio espiritual comum de toda a Igreja e uma parte da Igreja não
tem o direito de o alterar. Assim, o Ocidente, alterando arbitrariamente o
Credo sem consultar as Igrejas Irmãs do Oriente, tornou-se culpado de
"fratricídio moral" (como,lembrava um teólogo russo do séc 19,
Dimitri Khomiakov), isto é, de pecado contra a unidade da Igreja, contra a fé
católica que é conciliar. Como diria outro teólogo, Vladimir Lossky, a
controvérsia sobre o "Filioqüe" incidia, afinal, sobre o fato de que
"pelo dogma do 'Filioqüe', o Deus dos filósofos e dos sábios tomou o lugar
do Deus vivo... A essência incognoscível do Pai, do Filho e do Espírito Santo
recebe qualificações positivas, torna-se objeto de uma teologia natural,
relativa a 'Deus em geral', que pode ser o Deus de Descartes ou o de Leibnitz,
ou mesmo, até certo ponto, o de Voltaire e dos deístas descristianizados do
séc. XVIII" - mas não é certamente o Deus Tri-único que os santos mártires
proclamaram com o seu sangue. Ora é esta a acepção da Santíssima Trindade que a
Santa Igreja Ortodoxa igualmente proclama desde os Apóstolos até hoje e para
sempre.
5. A Igreja Romana intitula-se a
si mesma "Igreja Católica". Por seu turno, a Igreja Ortodoxa afirma
no Credo que crê na "Igreja Católica". Será que os ortodoxos e
católicos romanos crêem na mesma coisa...?
Efetivamente, ao cantarmos o Credo
na Sagrada Liturgia ou durante um Batismo, nós afirmamos que cremos na Igreja
"una, santa, católica e apostólica" - atributos da Igreja Una e
Indivisa, a Igreja dos Sete Concílios Ecumênicos, que a Tradição nos deixou
como preciosa herança. Hoje, depois de a Igreja de Roma se ter separado da
Árvore da Tradição (que é a Árvore da Vida), tanto essa Igreja como a Igreja
Ortodoxa se afirmam como "católicas". Mas enquanto para a Igreja
Romana "católico" significa universal, na Igreja Ortodoxa
"católico" quer dizer algo de mais concreto e mais íntimo, inerente
ao próprio ser da Igreja - toda verdade pode ser considerada universal mas nem
toda a verdade é a Verdade católica, que é a Verdade cristã. Querendo
identificar a catolicidade da Igreja como o caráter universal da missão cristã,
seremos obrigados a chamar católicas, também, a outras religiões como o
Budismo, o Islamismo... Sendo assim, devemos desistir de tentar identificar
"católico" como "universal". A Catolicidade é uma qualidade
da Verdade revelada e dada à Igreja; um modo de conhecimento da Verdade que é
próprio da Igreja de Cristo. A Catolicidade da Igreja constitui um acordo
perfeito entre a unidade e a diversidade, a natureza humana, que é una e as
diversas pessoas, que são múltiplas. Desse modo, "católico" é aquele
que sabe ultrapassar a sua própria individualidade, identificando-se
misteriosamente como o Todo e tornando-se testemunha da Verdade em nome da
Igreja - e é ai que reside, por exemplo, a força dos Padres da Igreja, dos
Confessores e dos Mártires, assim como a força dos próprios Concílios. "A
Igreja reconhece como seus, aqueles que estão marcados pelo selo da
catolicidade", dirá o grande teólogo Vladimir Lossky. Portanto, a
catolicidade não é um termo espacial ou geográfico para designar a extensão
física da Igreja, espalhada por toda a Terra: é uma qualidade própria da Igreja
de Cristo, desde o seu início e para sempre. E a Igreja está neste mundo, mas o
Mundo não pode contê-la, não pode limitá-la, porque Ela não é deste mundo...
6. O que é Igreja Local?
Para a Tradição da Igreja é
impensável admitir uma "Igreja universal" com centro em Roma ou
Constantinopla. Pelo contrário, a Tradição diz-nos que toda a importância
assenta na Igreja Local, ligada a um povo e a uma região. Sendo assim, a Igreja
Ortodoxa não é "democrática", como as Igrejas da Reforma protestante
(em que todas as igrejas são independentes, sem qualquer ligação entre elas),
nem "monárquica" como a Igreja Romana (em que tudo depende da decisão
de um governo central, como sede em Roma). A base da Ortodoxia é a Igreja
Local, espelho da Santíssima Trindade - as Igreja Locais são autocéfalas,
iguais em santidade e dignidade entre si e unidas numa sinfonia que é a Fé
comum, tal como as três Pessoas da Trindade Santíssima. Aliás, esta ideia da
igreja como espelho vivo da Trindade é muito mais vasta: a igreja possui três
Ordens menores (Leitor, Chantre e Subdiácono), três Ordens maiores (Diácono,
Presbítero e Bispo), três dignidades diaconais (Diácono, Protodiácono,
Arcediago), três dignidades presbiterais (Presbítero, Arcipreste,
Protopresbítero) e três dignidades episcopais (Bispo, Arcebispo ou Metropolita
e Patriarca). Resumindo, diríamos que a Igreja Ortodoxa é essencialmente uma
vasta família de Igrejas irmãs, unidas pela comunhão da mesma Fé e dos mesmos
mistérios, e diversas pelos seus ritos e pela sua localização no tempo e no
espaço. Para Ela não existe um centro nem um chefe único da Igreja que não seja
o próprio Cristo.
7. Mas existe uma diferença entre
Tradição e tradições?
Existe, de fato, uma diferença
entre a Tradição e as tradições. A Tradição é um tesouro comum a todas as
Igrejas Ortodoxas, seja a Grega seja a da Finlândia. As tradições podem ser
particulares a uma certa Igreja local, sendo igualmente transmitida como o tempo,
de pais a filhos, de mestres a discípulos. Na Igreja Ortodoxa existem duas
grandes tradições distintas, a grega e a russa, que se diferenciam entre si em
certos pontos de interpretação de usos e costumes da Igreja - por exemplo, a
tradição russa recebe os novos fiéis vindos de outros ramos, católico romano ou
protestante, pela imposição dos Santos Óleos do Crisma; a tradição grega recebe
os novos fiéis obrigatoriamente pelo Batismo. Mas sobrepondo-se a todas as
tradições particulares e locais existe a grande Tradição, criativa, contento em
si mesma a capacidade de se adaptar (sem se alterar) às mudanças que os tempos
exigem; uma Tradição que é uma vida, que deve ser vivida por dentro, no nosso
dia-a-dia, num encontro pessoal e constante com Nosso Senhor Jesus Cristo. A
nossa fidelidade a essa Tradição é a garantia de que estamos na verdade. A
Igreja a que pertencemos, a Igreja de Cristo, una e indivisa, encara a Tradição
como uma experiência viva do Espírito Santo no presente, e não como uma simples
aceitação do passado. Para nós, a Tradição não muda, é imutável, porque Deus
também não muda e a Revelação foi-nos dada uma vez por todas. A sua compreensão
perfeita só é possível dentro da Igreja, numa união permanente entre o Povo
Real (guardião da Fé) e o seu Clero, etc.
Conclusão: Diante dos fatos acima
expostos, não há como afirmar com certeza quem afinal de contas possui a
verdadeira sucessão apostólica. Sem dúvida, os católicos romanos devem ter em
seus arquivos uma série de contra respostas para o ataque da “ortodoxia”.
Todavia, aqui vale a pena refletir que, a verdadeira sucessão apostólica não se
trata de uma hereditariedade eclesial, pois se assim for, temos agora ao menos
2 tradições cristãs antigas que simultânea e opostamente declaram possuir tal sucessão.
É exatamente aqui, onde entra as Igrejas da Reforma Protestante! Entendemos que
a verdadeira sucessão apostólica se deriva diretamente das Sagradas Escrituras
Somente (Sola Scriptura). Especificamente dos escritos dos próprios apóstolos
no Novo Testamento. Nesse quesito inclusive, reconhecemos quem nem todas as “igrejas
protestantes” seguem tal sucessão (essa sim, verdadeiramente apostólica). Entretanto, as
principais denominações (reformadas, luteranas, anglicanas, presbiterianas,
congregacionais, batistas, etc) tem procurado seguir o ensino
verdadeiramente apostólico e neotestamentário (algumas mais, outras menos. Levando em consideração, nossas diferenças em
pontos secundários da fé e vida cristã). No que diz respeito ao catolicismo,
percebo particularmente, que entre o romanismo e a ortodoxia, esta última
aproxima-se mais da Bíblia. Tirem suas próprias conclusões...
Fonte:http://www.ecclesia.com.br/biblioteca/igreja_ortodoxa/o_cristianismo_ortodoxo_em_perguntas_e_respostas.html (transcrito e adaptado)
Pr.Samuel Santos (3ª Igreja Evangélica Congregacional de João Pessoa - AIECB)
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