sábado, 30 de maio de 2015

A Pentarquia no Cristianismo Primitivo e a Luta pelas Chaves na Igreja Antiga

Na história do cristianismo, pentarquia (do grego: pente – cinco, e arquia – governo ou governante) é um termo utilizado para referir-se a um sistema eclesiástico baseado no comando de cinco patriarcas; Roma, Constantinopla, Alexandria,Antioquia e Jerusalém. O termo pentarquia e seu valor jurídico (civil e canônico) foi especificado no Oriente pela legislação do imperador Justiniano I (527-565), e pelo Concílio In Trullo (692), no Ocidente suas sanções foram negadas ou aceitas parcialmente pelos papas, que sustentavam que Cristo ao tornar São Pedro, o primeiro papa, fundando a Igreja sobre ele, tornou-a por vontade divina, "monárquica, e não pentárquica".

Pentarquia também pode designar mais genericamente apenas o governo de cinco chefes ou a aliança de cinco nações.

Título de "Patriarca"

Havia bispos com os direitos dos patriarcas nos primeiros três séculos do cristianismo, embora o título oficial fosse utilizado apenas posteriormente. O título de patriarca aparece primeiramente aplicado ao Papa Leão I numa carta de Teodósio II no século V. No Oriente, nos séculos V e até o final do século VI o termo era aplicado a importantes bispos.

Em 531 Justiniano utiliza o título de "patriarca" para designar exclusivamente os bispos de Roma, Constantinopla, Alexandria, Antioquia e Jerusalém. Gradualmente a partir do século VIII e IX o termo adquire seu sentido atual, tornando-se um título oficial, utilizado apenas para uma classificação definitiva na hierarquia. Durante séculos o nome aparece geralmente em conjunto com "arcebispo".

Três primeiros patriarcas e classificação pelo Concílio de Niceia

Inicialmente havia apenas três patriarcas, os bispos de Roma, Alexandria e Antioquia. É desconhecida exatamente como eles obtiveram essa posição. Muitos historiadores tem sugerido que seus poderes especiais provieram do fato de que as três comunidades foram chefiadas por São Pedro (Roma e Antioquia foram, segundo a Sagrada Escritura e Tradição fundadas por Pedro e Alexandria por seu discípulo São Marcos).

Nos três primeiros séculos do cristianismo, o Bispo de Roma interveio em outras comunidades para ajudar a resolver conflitos, sugerindo o exercício da primazia papal primitiva. O historiador Will Durant escreve que após a queda e destruição de Jerusalém pelos romanos, a igreja de Roma tornou-se naturalmente a igreja principal, a capital do cristianismo. O Papa Clemente I no final do século I escreveu uma epístola à igreja em Corinto, na Grécia, intervindo em uma disputa importante . No principio do século II, Santo Inácio de Antioquia elogia a pureza da fé de Roma, e relata que ela exercia uma "presidência no amor" entre as igrejas cristãs. No final do mesmo século, o Papa Vítor I ameaça de excomunhão os bispos orientais que continuarem praticando a Páscoa em 14 de Nisã . No século III, o rival do Papa Cornélio I, o Antipapa Novaciano afirma ter “assumido a primazia”.

Os primeiros registros de uma jurisdição atribuída a Antioquia datam do final do século II, quando Serapião, bispo de Antioquia, interveio em Rosso, ele também consagrou o terceiro Bispo de Edessa, fora do Império Romano . Antioquia convocou concílios realizados em meados do século III, que participaram bispos da Síria, Palestina, Arábia Saudita, e as províncias orientais da Ásia Menor , indicando sua jurisdição mais primitiva. Dionísio de Alexandria falou desses bispos como formando o "episcopado do Oriente", que Demetriano, bispo de Antioquia ocupava o "primeiro lugar".

O poder de Alexandria era bem conhecido já no século III, sendo seu bispo o primeiro metropolita no Egito e nos territórios vizinhos africanos, quando outras sedes metropolitanas foram criadas, o bispo de Alexandria se tornou conhecido como o arco-metropolitano[16] , por exemplo, Héraclas de Alexandria exerceu seu poder como arco metropolitano pela deposição e substituição do bispo de Thmuis.

Os poderes especiais de Roma, Alexandria e Antioquia são citados pelo Primeiro Concílio de Niceia realizado em 325, que define de forma clara a jurisdição de Alexandria em seu cânon sexto: "O costume antigo do Egito, da Líbia e Pentapolis, segundo o qual o bispo de Alexandria tem autoridade sobre todos estes lugares" , o mesmo cânone ao citar o patriarcado de Antioquia defende que está preservando seus privilégios, embora não esclareça qual sua jurisdição: "Do mesmo modo, em Antioquia e nas outras províncias, as igrejas devem preservar seus privilégios." Ao citar Roma este cânone apenas decreta que "um costume semelhante existe em referência ao bispo de Roma". O bispo de Jerusalém é citado no seu sétimo cânon, como tendo uma honra especial (por lá ter ocorrido a Paixão e Ressureição de Cristo e o primeiro concílio ecumênico), mas sem possuir qualquer autoridade , e sendo submetido ao Arcebispo metropolitano da Cesaréia. Junto com a menção das tradições especiais de Roma, Alexandria e Antioquia, os mesmos cânones 6 e 7 falam da forma de organização metropolitana, que também foi o tema dos dois cânones anteriores, um sistema através do qual o bispo da capital de cada província civil (a Metropolita) possuí certos direitos sobre os bispos das outras cidades da província (sufragâneas), e que possivelmente tiveram sua origem também em torno do século III.

Concílio de Constantinopla e criação dos cinco patriarcados

Em 330 a capital do Império Romano foi transferida para Constantinopla, assim o concílio homônimo realizado em 381, decreta de forma pouco clara a criação de um patriarcado para esta cidade em seu terceiro cânon: “O Bispo de Constantinopla, no entanto, deve ter a prerrogativa de honra, após o Bispo de Roma, porque Constantinopla é a nova Roma” , esta prerrogativa de honra, no entanto não implica nenhuma jurisdição fora de sua própria diocese. O segundo cânon do mesmo concílio define a jurisdição do Bispo de Antioquia, que incluía todos as províncias orientais do Império Romano. O Primeiro Concílio de Constantinopla não tinha originalmente a intenção de ser um concílio ecumênico, mais apenas regional, motivo pelo qual os bispos ocidentais e o papa foram ignorados.

Acusações de Alexandria para a promoção de Constantinopla, levou a uma luta constante entre os dois na primeira metade do século V . O Primeiro Concílio de Éfeso realizado em 431 estende o poder de Jerusalém ao longo de três províncias da Palestina.

O Concílio de Calcedônia realizado em 451, considera o Concílio de Constantinopla como ecumênico, pois usa seu credo como uma continuação do Primeiro Concílio de Niceia (originando-se o Credo Niceno-Constantinopolitano), e reconhece definitivamente no cânone 28 o patriarcado de Constantinopla, definindo sua jurisdição sobre Ponto, Ásia menor e a Trácia. O concílio justificou esta decisão com o fundamento de que "os Padres justamente concederam privilégios ao trono da Roma antiga, porque era a cidade real", e que o que o Primeiro Concílio de Constantinopla "movido pela mesma consideração, deu privilégios iguais ao mais santo trono da Nova Roma, justamente a julgar que a cidade está honrada com a soberania e o Senado, e goza de privilégios de igualdade com a antiga Roma imperial, em assuntos eclesiásticos, bem devendo nas matérias eclesiásticas magnificar-se como ela e alinhar-se depois dela (...)". O Papa Leão I, cujos delegados estavam ausentes quando esta resolução foi aprovada e que protestaram contra ela, embora tenham reconhecido o concílio como ecumênico e confirmado seus decretos doutrinais, rejeitaram o cânon 28, argumentando que violava o cânon sexto do Concílio de Niceia, os direitos de Alexandria e Antioquia e que o Bispo de Roma baseava sua autoridade no fato de ser o sucessor de São Pedro e não o bispo da capital imperial . O mesmo concílio reconfirma a jurisdição do patriarca de Jerusalém sobre três províncias da Palestina. O Concílio de Constantinopla, por sua vez, citado pelo Concílio da Calcedônia só foi reconhecido pelo Ocidente como ecumênico no século VI pelo Papa Hormisdas e mesmo assim a validade do terceiro cânone, que cria o patriarcado de Constantinopla não foi aceito. Enquanto esses concílios delimitaram claramente o território dos quatro patriarcas orientais, o território do Bispo de Roma permanecia incerto e vago.

O imperador Justiniano I (527-565), no âmbito da "Renovatio imperii" ("Renovação do Império") na regravação do direito romano no Corpus Juris Civilis especificou as funções e a liderança dos cinco patriarcas e teve um papel decisivo na formulação da Pentarquia.

Conflitos entre Ocidente e Oriente

A pentarquia foi dogmatizada no Concílio In Trullo, ou Concílio Quinissexto de 692, que foi convocado por Justiniano II: "Renovando os atos dos 150 padres reunidos na cidade imperial protegida por Deus, e dos 630 que se reuniram na Calcedônia, nós decretamos que a Sé de Constantinopla deve ter privilégios iguais à Sé da antiga Roma, e serão altamente considerados em assuntos eclesiásticos como o é, e deve ser a segunda após ela. Depois de Constantinopla será classificada a Sé de Alexandria, em seguida, a de Antioquia, e depois à Sé de Jerusalém". A idéia de que com a transferência da capital imperial de Roma para Constantinopla a primazia na Igreja foi também transferida é encontrada nas cartas de João Filopono (c.490-c.570), e Fócio I de Constantinopla (c.810-c.893). Esse concílio foi aceito como ecumênico pelo Oriente, mas não pelo Ocidente, que não participou dele, sendo que o Papa Sérgio I (687-701) se recusou a aprovar seus cânones . O Papa Teodoro I em 642, usa pela primeira vez título de "Patriarca do Ocidente", como maneira de simbolizar a proximidade e a liderança do papa na Igreja Latina , embora o termo tenha sido utilizado apenas ocasionalmente e não descreva um território eclesiástico ou seja uma definição patriarcal. Em 732, o imperadorLeão III, o Isáurio, como retaliação a oposição do Papa Gregório III com a iconoclastia, transferiu a Sicília, Calábria e Ilíriado Patriarcado de Roma à de Constantinopla.

A visão do Oriente sobre a pentarquia entrava fortemente em choque com os ensinamentos dos Papas, que invocavam jurisdição sobre todos os assuntos da Igreja e o direito de julgar até mesmo os patriarcas. Em cerca de 446 o Papa Leão I tinha expressamente reivindicado autoridade sobre toda a Igreja: "O cuidado da Igreja universal, deve convergir para a cadeira de Pedro, e nada deve ser separado de sua cabeça". O Papa Gregório I no século VI declarou que nenhum concílio ecumênico poderia ser chamado sem a autorização do papa, o Papa Nicolau I reconfirmou esta decisão num sínodo realizado em Roma em 864, e até o pontificado do Papa Adriano II (867-872), nenhum dos Papas reconheceram a legitimidade dos cinco Patriarcas Orientais, mas apenas os de Alexandria e Antioquia. Do século V ao XI foram numerosas as rupturas seguidas de reconciliação entre as igrejas do Ocidente e Oriente. Em 1053 e 1054 os legados romanos do Papa Leão IX, viajaram para Constantinopla para insistir no reconhecimento da primazia papal, o patriarca de Constantinopla se recusou a reconhecer sua autoridade e se excomungaram mutuamente, posteriormente a separação entre Ocidente e Oriente se desenvolveu quando todos os outros patriarcas orientais apoiaram Constantinopla, no evento do Grande Cisma. Posteriormente tentativas fracassadas de reunificação foram realizadas pelo IV Concílio de Latrão (1215) e o Concílio de Florença (1439), que consideram o Papa como o primeiro dos cinco patriarcas.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Pentarquia

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